[FP] Claremont, Faith

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{Seu Corpo}

- Nunca parou para pensar em qual era sua altura exata, mas sabia que era bem alta, bem mais alta que a maior parte das pessoas que conhecia. Era como se a garota tivesse passado duas vezes na fila “como chamar a atenção”, afinal, ela sempre se sentira como um poste ruivo ambulante. A forma como se sentia era bem diferente do que todos achavam, não que ela jamais tenha escutado.
A ruiva nunca fora muito boa em mentir, até porque os seus olhos verde-claros e a coloração rosada que as maçãs de seu rosto tomavam sempre desmentiam qualquer história que resolvesse inventar.
Tinha algumas poucas sardas em volta do nariz e das bochechas, contudo, de tão claras que as mesmas eram, mal poderiam ser vistas se a proximidade não fosse grande.

{Personalidade}

Quer saber, caro leitor? Uma personalidade não é algo fácil de ser definido – se é que existe apenas uma personalidade habitando um só corpo. O narrador presente prefere ter essa crença cega na variedade, no inesperado, e talvez seja isso o que ele tanto ama no ser humano: o inesperado vir de fontes ainda mais inesperadas. Cada ser em sua própria concha individualizada de possibilidades, sem essa baboseira de bom ou mau, e sim bom e mau. Uma pitada a mais de um do que de outro, talvez, e mesmo assim inesperadamente balanceados. E era isso o que Faith Claremont era, um poço de contradições, com seus lados negativos e positivos.
Não gostaria de começar com sua descrição com o clichê “como qualquer outra garota...”, até porque, não é nisso o que Ele prefere acreditar. Mas gostaria de frisar que Faith era apenas mais uma adolescente de dezoito anos, com os altos e baixos no seu “yin-yang” privativo. Ou talvez estivesse apenas tentando justificar um futuro que o leitor ainda não conhece. Deixaremos isso por interpretação própria.
A ruiva era aquele tipo de garota que por mais que chamasse a atenção por onde passasse, fazia questão de se esconder o máximo possível, tinha um certo medo da opinião alheia, medo do que poderiam dizer dela se a avistassem. Conhecia sua fama de esnobe naquele lugar, e ela não fazia nada para desmentir. O que diria? Que apanharia se andasse com as “companhias erradas”? Isso só iria piorar, o melhor a ser feito era ignorar. Não achava que ninguém era melhor que ninguém, nunca achou. Mas do que adiantava falar isso para as pessoas? Jamais acreditariam nela, e de qualquer forma, não achava que um dia conseguiria falar a real verdade sobre si. Não sabia se um dia conseguiria aguentar mais e mais críticas sobre suas escolhas, sobre sua vida. Por isso a timidez com estranhos, e por isso os sorrisos singelos que sempre exibia para todos – quase como um pedido de desculpas.
Contudo, a verdade era que Faith era uma garota criativa, sonhava mais do que vivia. Tinha a cabeça nas nuvens e os pés no chão, dançando mesmo no simples andar. Era a dona de amizades sem estrutura, um futuro imposto, uma vida de fachada. Uma garota solitária.
E era isso o que gostava em Eufaula, a cidade sempre trouxe para si esse otimismo idiota.  Primeiramente porque os cidadãos ainda não conheciam os boatos da filha de marionete dos Claremont, e depois, sua paixão de infância - Henry Hoffman.  O primeiro a conhecer a verdadeira Faith. O primeiro antes de três garotas aparecerem em sua vida. Heaven, Holly e Angel. Elas eram suas melhores amigas – suas únicas amigas verdadeiras, e sinceramente sabia que faria de tudo por elas. Qualquer coisa. Inclusive, participar de uma das coisas que nunca fora a favor: os atos esnobes. Sabia que elas tinham lá suas razões e as respeitavam e apoiavam plenamente. Sobretudo porque, um dos alvos de suas amigas era um grupo de garotas da escola, onde uma das integrantes era Audrey Clark. Não, não tinha nada contra a outra ruiva, nada pessoal pelo menos. Se ela não fosse o foco de todo aquele amor platônico de Henry, ela com certeza não teria nada a dizer sobre a garota. O que não era o caso.

{História}

Faith crescera em um ambiente familiar tão dócil quanto uma ditadura. O pai, mais um general do que uma figura paterna em si, e a mãe, uma fanática religiosa, buscando na bíblia o que nunca encontrara em si mesma – seja lá o que for. James e Helen tinham uma filha, e isso era um fator biológico incontestável, mas sequer a conheciam. Honestamente, desde que a garota nascera, o maior diálogo que já tiveram entre si fora sobre o que fazer com o futuro da Claremont: Ingressar na carreira militar? Medicina? Arquitetura? O que será que traria mais dinheiro? E mesmo assim, nenhuma palavra saíra da boca da ruiva durante toda a discussão. E esse, senhoras e senhores, era o tipo de relacionamento que tecnicamente deveria ser o mais forte e afetuoso que uma pessoa jamais teria. Sempre fora assim para a ruiva. Nunca lhe fora perguntado com aquele tom inocente sobre o que a garota gostaria de ser quando crescesse, com um sorriso brincalhão não dando qualquer credibilidade a resposta. E para quê fariam isso, se já sabiam na ponta da língua o futuro da filha única? O vestuário, a alimentação e até mesmo os amigos – tudo isso era decidido esporadicamente e sem nenhum aviso de antecedência pelos pais. Isso seria facilmente insuportável na visão de uma pessoa submissa e passiva, mas Faith não era nem um, nem outro.  A ruiva poderia ser descrita como um pássaro preso dentro de uma jaula, condenado a assistir pelas frestas a liberdade de outros que nunca chegou a possuir. Uma amizade verdadeira, gostar de algo pelo simples motivo de gostar daquilo, e não por ter sido obrigada a aturá-lo. Eram tantas as coisas que ela queria... Queria dançar. Viver da dança. Sabia que era ridículo – o que os pais pensariam? Mas não conseguia evitar essa paixão secreta que tinha.  O único momento em que chegava a experimentar dessas pequenas alegrias, era no verão. Todo verão, viajava para a pequena cidade de Eufaula no Alabama para a casa dos avós, e ali, diferentemente de Nova York onde estava longe demais do olhar crítico dos pais, conseguia ser ela mesma. Ali, ao lado daquele garoto de olhos castanhos e sorrisos sinceros sentia-se mais do que segura. Ele lhe estendia a mão, e ela sabia que era com ele que queria seguir. Os verões que passaram juntos nunca mais foram esquecidos, cada pequeno momento, desde as competições infantis de bicicleta pela cidade que começavam logo de manhãzinha, até o entardecer que dividiam juntos, compartilhando risadas e segredos. Cada detalhe, cada olhar. Faith amava tudo em Henry, até mesmo o que qualquer outro consideraria um defeito, ela sinceramente não se importava. Henry era o Henry, e tudo nele morava em seu coração que sempre batia estupidamente mais rápido quando se aproximavam.
Estúpido era uma palavra que definia muito bem o sentimento que a ruiva guardava pelo Hoffman. Estúpido porque o garoto agora faria parte de um dos muitos sonhos e desejos que sabia que jamais poderia realizar. Estúpido porque era apenas mais uma decepção. Desde que o conhecera sabia que ele era apaixonado por uma outra garota desconhecida de sua escola, e ano após ano era a mesma coisa, o mesmo sentimento. Nada mudava e ela sabia que nada nunca mudaria.
Os anos passaram mais rápido do que um piscar de olhos, e então a ruiva nunca mais voltara para Eufaula. Os avós faleceram, um atrás do outro com poucos meses de diferenças, e Faith sabia que se colocasse os pés novamente em Eufaula seria com os pais, e a pequena cidade no Alabama perderia toda aquela mágica que ela tanto amava. Vendo agora, sabia que fora uma besteira, mas de qualquer forma os pais jamais chegaram a citar a pequena cidade novamente. Não até agora, quando receberam uma ligação avisando que eles eram os parentes mais próximos de Meredith e Charles, portanto a casa agora era propriedade deles por herança direta.
Após diversas discussões entre James e Helen, finalmente decidiram se mudar para Eufaula para a pequena casa onde vivera tantos momentos felizes. De volta para o lugar onde sabia que o encontraria novamente.